Imagem: claudia.abril.com.br |
Ontem à noite eu vi a uma chamada do Fantástico de uma reportagem que vai passar hoje à noite sobre acumuladores compulsivos, e isso me fez refletir novamente sobre este assunto que, já há um bom tempo, eu queria trazer aqui pro blog.
Vou iniciar este post já fazendo uma confissão: eu me considero uma acumuladora. Porém, pelo menos até hoje, esse é um impulso que eu consigo manter sob controle.
E, como as pessoas que têm este problema, geralmente não têm consciência dele, ou pelo menos não admitem pras pessoas próximas que algo está errado, fica difícil saber como funciona a mente de um acumulador e, consequentemente, como ajudá-lo.
Por isso, eu resolvi me expor aqui no blog, contando um pouco de como é a minha vida de acumuladora e como eu lido com esse distúrbio no dia a dia.
Pontos importantes
Antes de mais nada, vou deixar claro que aqui neste post eu estou me referindo à minha experiência pessoal e que nada do que eu disser aqui deve ser tomado como uma regra universal. Cada pessoa é uma pessoa.
Outra coisa, eu tenho consciência de que o meu "grau de acumulação" é leve (pelo menos por enquanto), pois eu consigo conter meus impulsos e racionalizar a questão. O que uma pessoa compulsiva já não consegue mais.
O que motiva o acumulador
Eu já falei aqui no blog algumas vezes o quanto eu me sinto responsável por todos os materiais que chegam até mim de alguma forma, pelas embalagens de todos os produtos que eu consumo, por todos os resíduos que eu gero, etc.
Essa sensação de responsabilidade/culpa pelo lixo gerado e seu impacto no meio ambiente é um dos pilares do meu distúrbio. Eu me sinto mal por gerar resíduos, por jogar alguma coisa fora. Por isso, eu tenho esse impulso de querer reaproveitar tudo.
Em certa medida, eu até consigo. Aqui mesmo no blog eu já escrevi vários posts mostrando coisas que eu criei a partir de materiais reaproveitados. Como a mesinha de cabeceira e a prateleira feitas de caixotes de feira, os potes de creme que já reutilizei, as roupas antigas que eu transformo em outras, etc...
Porém, já tem muito tempo que eu entendi que essas atitudes são sim importantes, mas insuficientes para resolver o problema mundial da geração de resíduos. Eu não vou conseguir salvar o planeta.
Então, hoje em dia, eu me controlo para guardar somente o que eu realmente vou conseguir reutilizar de forma adequada e num prazo de tempo não muito longo. Porque senão, eu vou juntar coisas que eu nunca vou utilizar e vira uma desculpa para simplesmente acumular por acumular.
Razões emocionais
Baseada na minha vivência, eu digo que o acumulador junta coisas para tentar compensar um vazio emocional, uma falta.
Eu já tive várias fases. A fase de comprar roupas demais só porque estava em promoção, a fase de comprar esmalte toda semana, mesmo já tendo em casa uma cor quase igual, a fase de não poder ver um tecido bonito sem trazer para casa, a fase de comprar mais linhas de crochê do que eu tenho mãos e tempo para crochetar, a fase de comprar mais cremes do que eu tenho pele e cabelo para usar (estou nessa fase no momento, inclusive).
Mudam as obsessões momentâneas, mas o problema de fundo é mais ou menos o mesmo: suprir uma falta emocional com coisas materiais. Comprar demais para não perder aquela promoção ou por medo de que um dia falte.
A gente passa a vida fugindo de si mesmo. Tudo para não se encarar, não confrontar nossos demônios. Por isso, constatando que eu tenho vivido ciclos em que uma hora eu estou obsessiva por uma coisa e outra hora por outra, eu estou focada em encarar o meu vazio, encarar o que dentro de mim me faz querer acumular.
Sacola de roupas que acumulei anos atrás e tenho diminuído ao longo dos anos transformando e customizando as peças. |
Cuidado, criativos
Além da motivação emocional, que é quase sempre, inconsciente, enquanto designer e artesã, eu também preciso dizer que é muito difícil ser criativo e organizado ao mesmo tempo.
Porque a criatividade nasce do caos. Toda pessoa criativa precisa deixar fluir o seu turbilhão de ideias interno, ter contato com diferentes cores, texturas, formas, estar cercada por materiais, coisas que a inspirem.
E eu vivo nessa corda bamba, tentando me equilibrar entre a criatividade e a loucura. Eu preciso me policiar o tempo todo para diferenciar o que é estar sendo artista, criativa, e estar sendo simplesmente acumuladora.
Quem é criativo sabe a tendência que nós temos de comprar muitos materiais, sejam tintas, tecidos, linhas, livros, cadernos... tudo com a desculpa de que precisamos ou que vamos criar algo com aquilo e muitas vezes nunca fazemos.
O que eu acumulo?
Eu acumulo desde coisas de uso cotidiano até coisas mais específicas do meu ofício de designer/artesã. Coisas que eu guardo em casa no momento, a maioria no meu quarto, até como uma forma de controlar:
- Aparelhos antigos, como rádios, câmeras e celulares;
- Embalagens e potes de plástico que pretendo reutilizar;
- Produtos de beleza em excesso;
- Linhas de crochê;
- Tecidos e retalhos;
- Roupas;
- Livros e revistas;
- Bolsas de eventos, ecobags;
- CDs antigos, fitas cassete;
Como controlar o problema
Uma coisa que eu vi na prática e que é muito verdade é: o seu ambiente é reflexo da sua mente. Quanto mais desordenadas estiverem as suas ideias e as suas emoções, mais caótico será o ambiente onde você vive.
Da mesma forma, quanto mais eu organizo meus pensamentos, minha vida interior, mais calmo e organizado é o meu mundo exterior. Isso é fato, gente. Não é papo de coach de organização.
Eu já comprei muita roupa só porque estava barato, e tenho peças demais até hoje, que eu vou transformando, customizando e ressignificando aos poucos ao longo da vida. Porque eu sou estilista e tenho prazer em fazer isso, eu gosto.
Mas, já tem anos que eu me proibi de comprar roupas novas. Só compro o estritamente necessário para o trabalho, mais nada. Para ficar em casa ou sair a lazer eu me viro com o que eu já tenho.
Da mesma forma, materiais de artesanato eu só compro o mínimo necessário para atender as encomendas da loja virtual. Só muito de vez em quando, eu abro uma exceção para comprar algo diferente para criar uma peça nova. De resto, é me virar e criar coisas com o que eu já tenho no ateliê. Isso é ótimo para estimular a criatividade, inclusive. Crie a partir do que você já tem.
A forma como eu lido com esse impulso acumulador é autocontrole. Eu me proíbo de comprar, eu me proíbo de guardar. Quantas vezes, eu estou em alguma loja e, internamente, tem uma mãe e uma criança imaginárias brigando dentro de mim.
"Você precisa mesmo de mais essa 'brusinha'? Solta isso. Mas tá 10 reais. Não interessa, seu guarda-roupa tá cheio. Solta isso agora."
É assim mesmo, tá gente. E o mesmo diálogo interno acontece quando eu entro na Caçula e agarro um novelo de linha, ou na drogaria com algum pote de creme de pentear.
Dentro de casa, eu gosto de deixar tudo que eu tenho de uma forma visível para que eu me lembre de usar, de transformar, utilizar...
De tempos em tempos, eu jogo fora coisas mais antigas que eu realmente não utilizei ao longo dos anos. Tento deixar tudo minimamente organizado, separado por tipo.
Nessa questão, o fato de eu ser virginiana me ajuda muito. Eu tenho naturalmente a tendência de organizar, catalogar, racionalizar. Se não eu me perderia na minha loucura.
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